Noite dentro da noite

Foi como se cada momento que tivessem vivido, cada pedaço de vida que tivessem construído nunca tivessem existido, ou tivessem sido varridos for uma força sobrenatural, desfazendo-se um mil bocados. Naquele exacto momento, não interessava o amor, não interessavam os sonhos, não interessava tudo o que se começou a construir.
Nada restou depois daquela conversa, das palavras que ela lhe disse e que o magoaram irremediavelmente.
Nada ficou a não ser o olhar gélido do homem que ela amava e o silêncio das palavras que ele queria dizer mas não disse. O silêncio que devia ter sido o grito que ele não deu. Ficou o vazio. Era nesse vazio que ela teria de adormecer nessa noite.

Essa noite, ela sabia que não iria receber o seu beijo antes de dormir, sabia que ele não iria ceder o cantinho aconchegante debaixo do seu braço, que a ajudava a adormecer. Ele iria afastar-se e no meio da cama ficaria o vazio e o silêncio. Ele iria virar as costas e não dizer uma única palavra antes de adormecer. Era difícil imaginar que esse silêncio fosse durar noite inteira... mas ela sabia que era isso que ía acontecer. O silêncio e o escuro. Seria uma noite dentro da noite.

O meu sono não será o mesmo sono tranquilo de todas as outras noites. A tua última palavra esta noite foi o silêncio ... logo tu, que não deixas nada por dizer. Talvez já tenhas dito tudo. Sim, disseste tudo e eu entendi. Esta noite, nada mais posso fazer senão adormecer no meu canto, longe de ti, longe do teu perdão. Espero que quando acorde amanhã, me terás perdoado.