16 de setembro de 2005

Negros, onde estão?

A minha querida amiga e correspondente Paula mandou-me este artigo e sugeriu que eu o publicasse no blog. Não pensei duas vezes. É preciso abrir os olhos para muita coisa que nos passa ao lado neste mundo. Este texto mostra-nos verdades cruéis a que muita gente tapa os olhos em prol de "não agitar" certas susceptibilidades, certas "minorias".
Trata-se de um artigo da jornalista portuguesa Clara Ferreira Alves (aproveito para dizer sou fã desta grande mulher).

Este artigo pode ser encontrado no Diário Digital

A América (e o resto do mundo) entrou em estado de choque com os pobres desalojados do Katrina. Negros, a maioria. Os jornais, as rádios, as televisões, os colunistas, os "pundits" apontam o dedo a uma pobreza americana, de raça negra, sulista, vítima da desigualdade, dos cortes orçamentais aos programas de combate à pobreza, dos cortes na Saúde e na Educação, dos cortes do welfare. Vítima do racismo e do esquecimento, da feroz desigualdade dos estados do sul, de maioria negra, em que os brancos controlam o poder económico e social. Está tudo certo, é tudo verdadeiro.

Mas, toda a gente sabe que existe uma classe média negra na América, com poderosas organizações de direitos civis. E que existe, tanto em Hollywood e Los Angeles, como em Chicago, como em Nova Iorque, um clube de milionários negros, poderosíssimos, que controlam o mercado da música rap que domina o mundo, controlam o merchandising da música rap, e controlam o mercado de raça negra consumidor desse merchandising (e não só, todos os
miúdos brancos, de todo o mundo ocidental e abastado, copiaram a street fashion e os tiques dos rappers americanos).

Mas, alguém viu da parte desta gente, que se caracteriza pelo consumo conspícuo de moda de alta costura e logos, de diamantes, de roupas caríssimas, de iates e carros, de jactos privados, e de um estilo de vida ostentosos à boa maneira dos líderes africanos corruptos, alguém viu, dizia eu, um grande movimento de solidariedade e ajuda financeira aos seus irmãos negros do sul? Alguém viu P. Diddy, Lil Kim, Russell Simmons, Quincy Jones,
Mary J. Blige, e os milhares de rappers milionários de Chicago e Nova Iorque e da Califórnia, fazer o que fizeram alguns actores e celebridades de Hollywood e ajudar, ou abraçar, um desgraçado que perdeu a família e os bens no Katrina?

Alguém viu o reverendo Jesse Jackson, ou Eddie Murphy, ou inefável reverendo Al Sharpton, ou mesmo os boxeurs negros e bem de vida como Mike Tyson (e de Michael Jackson e da sua família nem é bom falar) levantarem a voz e a mão num gesto altruísta? Só Oprah Winfrey o fez, e tem feito, e continua a fazer. Ela é a negra mais bem sucedida da América e a que tem maior consciência social. O resto, não existe, ou existe egocentricamente. Corruptamente.

Quando se culpa apenas a Administração Bush de tudo, e os brancos de tudo, de todo o racismo, deixa-se de lado o racismo de negros contra negros, o fosso entre ricos e pobres da mesma cor. Existe, e são poucos os que o saltam.

Na América, como em África, quem menos ajuda os negros são os negros.

Clara Ferreira Alves (Jornalista portuguesa)

2 comentários:

Ordinary disse...

Concordo com quase tudo. Não concordo com a critica feita aos negros com dinheiro por não estarem a ter nenhum tipo de contribuição na ajuda do Katrica. Não concordo porque foi feita uma distinção! Não há que perguntar porque que os negros com condições financeiras não ajudam, mas sim perguntar porque que a pessoas em geral,( seja ele negro, branco chinês, etc) com poder financeiro não ajudam. É verdade que essa elite negra exageram no estilo de vida que levam, isso não implica que outros não tenham o mesmo tipo de vida de ostentação, apenas não o mostram tão abertamente! Pergunto eu, qual é a diferença. A Diferença aqui foi a distinção feita mais uma vez entre negros e brancos, sem necessidade o negro por ter dinheiro e não ajudar é criticado, o branco e principalmente o Bush é ilibado! Bolas isso não! Para mim isto é apenas mais uma forma de racismo.

Mariana de Barros disse...

A questão não é essa. A questão é que o negro americano queixa-se tanto de passar mal naquele país e falam dos seus antepassados, mas quando têm um pouco de poder e dinheiro, acabam por ser como os brancos, vêm a sua própria gente a precisar e não fazem nada, à excepção de um ou outro que se preocupa. O Bush continua a ter a mesma culpa que sempre teve, todos sabemos que ele é racista e não se preocupa muito com os negros... mas não é o único. A questão aqui é a hipocrisia de das pessoas que quando estão por baixo, são uma coisa e quando conseguem algum poder, passam a ser exactamente iguais aos outros.Não cabe apenas ao governo ajudar, cabe a todos os que tiverem possibilidades para isso... o que não acontece porque estão demasiado ocupados a serem ricos e poderosos. Nem do Jessie Jackson, que é aquele defensor que pensávamos conhecer bem se ouviu um pio.